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quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

George Simenon - Livros Inéditos no Brasil


A Editora L&PM anuncia que publicará a partir deste ano mais 20 livros, assim como os contos completos protagonizados pelo Comissário Maigret do escritor George Simenon, veja a matéria na integra extraída do site da L&PM em lpm.com.br.

Georges Simenon: Só a Bíblia, Lênin e Marx são mais lidos


A coleção L&PM Pocket publicou em 2002 e 2003, em parceria com a Editora Nova Fronteira, 22 livros de Georges Simenon narrando as aventuras de seu célebre e clássico personagem, o comissário Jules Maigret. Agora, a partir de março de 2009 a L&PM publicará mais 20 livros deste grande autor no formato pocket; 15 aventuras de Maigret – a maioria inédita no Brasil – e 5 romances, entre eles, o célebre Ainda existem aveleiras, considerado por críticos e fãs um dos melhores romances do escritor belga.


A L&PM Editores também adquiriu os direitos para publicar no Brasil os contos completos protagonizados pelo comissário Maigret, num total de 30, que serão editados em formato convencional ainda em 2009.


Georges Simenon nasceu em Liège, na Bélgica, em 1903 e morreu em Lausanne, na Suíça, em 1989. Escreveu perto de 400 obras de ficção, entre as quais 89 romances e 28 contos protagonizados por Maigret; vendeu mais de 550 milhões de livros que foram traduzidos em 55 línguas e publicados em mais de 100 países. Foram realizados cerca de 50 filmes baseados em seus livros.


Abaixo, transcrevemos artigo sobre o autor e a entrevista realizada pelo jornalista italiano Roberto Gervaso em 1979 e publicada no Brasil pela revista literária Oitenta (L&PM, 1980).
Por Roberto Gervaso (Tradução de Ana Paula de Melo Mendonça)


MILÃO – Georges Simenon, um grande escritor que há meio século é lido em todas as partes do mundo, que é belga e não francês como muitos pensam. Só produz livros de sucesso: não há aventura do seu famoso “inspetor Maigret” que não tenha se tornado best-seller.
Mas não é somente o sucesso comercial que lhe é reconhecido. Há um consenso também em torno da qualidade literária do seu trabalho. “É o mais autêntico romancista da literatura francesa contemporânea”, celebrou André Gide. “A sua arte é de uma beleza intolerável”, disse Mauriac. Entre os seus leitores mais célebres e mais fanáticos nesses cinqüenta anos estão Mao Tse-tung, Lyndon Johnson, Charles Chaplin, o rei da Suécia, Céline, Maurois, Henry Miller.
Depois de repudiar o seu suntuoso e inacessível retiro de Epalinges, Simenon, embora cada vez mais rico com os incalculáveisdireitos autorais que recebe de mais de 100 países deci­diu há 10 anos morar num pequeno apartamento de poucas peças no centro de Lausanne. Mora com Teresa, sua última mu­lher, de sangue italiano, com ele há mais de 20 anos, que recorda o que ele esquece, fazendo os contatos com editores e protege-o da curiosidade pública.
O “pai da literatura policial feita com arte”, ou o “patriarca belga da literatura francesa” produziu em cinqüenta anos mais de 400 volumes. A Universidade de Liége, sua cidade natal, fun­dou o Centro de Georges Simenon que recolhe os manuscritos, a interminável correspondência, e as edições nas várias línguas das obras do mestre. Este Centro é muito procurado por estu­dantes de literatura de vários países da Europa que escrevem teses sobre Simenon.
Dizem – e deve ser verdade – que nenhum escritor do mun­do recolhe tanto dinheiro em direitos autorais. Dizem também – e também não há por que duvidar – que ninguém teve mais mu­lheres: cerca de dez mil, contra as cinco mil de Frank Sinatra, as mil e duzentas de John Kennedy, as aproximadamente mil de Don Juan e as cento e oitenta ou duzentas (há divergência na cifra) de Casanova.
Aos 76 anos, que não demonstra, sempre a fumar um dos seus vinte cachimbos, usando aparelho para surdez, o copo na mão (cerveja, bordeauxou chá), passa a maior parte do seu tempo numa das peças do seu pequeno apartamento que serve como estúdio e quarto. Ali, ele dorme, come e dita ao gravador suas inesgotáveis Memórias, num esforço para entregar a própria vida aos pósteros. E, talvez, também aos contemporâneos. À noite, depois do telejornal, antes de se recolher, dedica algumas horas a reler, com o mesmo gosto e a mesma surpresa da primeira vez os Essais de Montaigne.
Foi ali, no escritório-alcova de Simenon que o repórter Ro­berto Gervaso, do Corriere della Sera, de Milão, encontrou-o. Esta foi a conversa entre os dois:
Roberto Gervaso – É verdade que você é o autor mais lido, depois de Marx?Georges Simenon – Segundo as estatísticas da UNESCO, sim. Mas, há outros, além de Marx, mais lidos do que eu.
R.G – Quais são?G.S. – A Bíblia e Lênin, que são mais lidos do que Marx tam­bém.
R.G – Onde você tem mais leitores?G.S. – Nos Estados Unidos e na União Soviética.
R.G – Mais mulheres ou mais homens?G.S. – Tomando como ponto de referência as cartas que recebo, é metade por metade.
R.G – O que lhe dizem as mulheres nas cartas? G.S. – Fazem confidencias e pedem conselhos.
R.G – E os homens?G.S. – Contam-me os seus problemas. São, sobretudo, médicos e psiquiatras.
R.G – Mais lido pelos jovens ou pelos menos jovens?G.S. – Dos 13 aos 80 anos.
R.G – Pelos intelectuais ou pelo homem médio?G.S. – Por estes e por aqueles.
R.G – Como se desenvolve a sua inspiração literária?G.S. – Jamais tive inspiração literária.
R.G – Você se define como um artesão, eu sei. Por quê?G.S. – Porque eu, efetivamente, trabalho como um artesão. Sen­to-me à mesa de trabalho – isto é, na poltrona – numa hora de­terminada, trabalho um determinado tempo e, só depois de cumprir o expediente, me levanto.
R.G – Onde termina o artesanato e começa a arte?G.S. – É muito difícil dizer.
R.G – Por quê?G.S. – No artesanato, seguidamente, tem arte, e na arte tem ar­tesanato.
R.G – Acredita no estado de graça?G.S. – Acredito no escritor se desfazer da sua pele e entrar na pe­le do personagem.
R.G – Ainda diria a frase que disse certa vez: “Não sei e não saberei jamais se tenho talento?”G.S. – Sim. O talento é algo que avaliam os pósteros e não os contemporâneos.
R.G – Mas o que é o talento?G.S. – É a capacidade de inventar um caráter, uma situação, uma paisagem.
R.G – Escritor é só aquele que se faz ler?G.S. – E quem mais seria?
R.G – A desenvoltura faz o perfeito narrador?G.S. – Sempre se deve escrever como se fala.
R.G – É fácil escrever fácil?G.S. – Não. É dificílimo.
R.G – E as suas relações com os adjetivos?G.S. – Péssimas. Odeio-os, como também detesto os advérbios. Aborrecem-me os enfeites e lantejoulas do texto. Acabam por torná-lo obscuro. E preciso ser compacto, reduzir tudo ao osso.
R.G – Um escritor é sempre autobiográfico?G.S. – Eu não sou. Mas, alguns são.
R.G – Primeiro dever de um escritor?G.S. – Tornar-se lido e ser sincero.
R.G – De um jornalista?G.S. – Idem.
R.G – O escritor-personagem nasce só do juízo do público?G.S. – O sucesso é determinado pelos leitores.
R.G – É mais rara uma vida bem vivida ou bem escrita?G.S. – Bem escrita. É melhor, porém, se for bem vivida.
R.G – Chegará também para você a hora do Prêmio Nobel?G.S. – Se chegar, recusarei.
R.G – Por quê?G.S. – Os prêmios são como as medalhas, os laços de fita e os penachos que enfeitam as vacas e touros vencedores nas exposi­ções de animais.
R.G – Quem lhe inspirou Maigret?G.S. – Os vários policiais que conheci.
R.G – Quando nasceu?G.S. – Quem?
R.G – Maigret.G.S. – Em fevereiro de 1929.
R.G – Onde? G.S. – Num vilarejo holandês de pescadores. Lá, hoje, há um monumento para ele.
R.G – Quantos livros você dedicou a Maigret?G.S. – Oitenta e nove.
R.G – Por que Maigret agradou e ainda agrada tanto?G.S. – E um homem comum, como tantos, que sabe compreen­der, mas não julga.
R.G – O melhor Maigret no cinema?G.S. – Nenhum.
R.G – Como nenhum?G.S. – Maigret existiu e existe somente na minha cabeça. É meu, exclusivamente meu.
R.G – Por que você o aposentou há sete anos?G.S. – Não foi ele o aposentado. Fui eu que me retirei.
R.G – Nas suas histórias, não existe o tempo: nem a guerra, nema resistência, nem a era atômica. Porquê?G.S. – O homem, no seu íntimo, não tem nada a ver com a guer­ra, com a resistência, com a era atômica.
R.G – As piores armadilhas do romance policial?G.S. – Mas Maigret não é Poirot, e eu não sou Agatha Christie.
R.G – Explique-se.G.S. – Os romances policiais têm regras bem precisas, enquanto eu não tenho. Na segunda página, posso tranqüilamente revelar o nome do assassino.
R.G – Com quantos anos escreveu o primeiro romance não-policial?G.S. – Aos 31 anos.
R.G – Quantos escrevia, em média, por ano?G.S. – Policial, um; não-policiais, cinco.
R.G – Nunca renegou uma obra?G.S. – Não. Basta não relê-las, como o meu amigo Fellini nunca revê os seus filmes.
R.G – Voltaire escreveu Candideem três dias. Você, em quanto tempo escrevia, ou escreve, um romance?G.S. – No início, levava onze dias.
R.G – E no fim?G.S. – Uma semana.
R.G – Usou muitos pseudônimos?G.S. – Dezessete.
R.G – Quando começou sua autobiografia?G.S. – Dia 13 de fevereiro de 1973.
R.G – Título do primeiro volume?G.S. – Um homem como qualquer outro.
R.G – Você?G.S. – Sim, eu.
R.G – Em que ponto estão suas memórias?G.S. – Estou concluindo o décimo-nono volume.
R.G – O seu autor policial favorito?G.S. – Nenhum. Não os leio.
R.G – Nem mesmo Agatha Christie?G.S. – Nem mesmo ela.
R.G – E não-policial?G.S. – Refere-se aos meus autores de cabeceira?
R.G – Sim.G.S. – Antes de tudo, Montaigne.
R.G – E depois?G.S. – Conrad, Gogol, Checov, Dostoiévski, Faulkner.
R.G – Você disse que, se recomeçasse, seria biólogo.G.S. – Amo o homem. Quero conhecê-lo e entendê-lo. A biologia ajudaria muito.
R.G – Você é considerado um homem de esquerda?G.S. – Sou um individualista empedernido.
R.G – Os burgueses não o agradam. Por quê?G.S. – São convencionais demais, e pouco individualistas de­mais.
R.G – Já fez política alguma vez?G.S. – Não. Nunca votei ao menos.
R.G – Você diria com Clemenceau: “Quem faz política para valer, suja as mãos?”G.S. – Com as mãos limpas, não se faz política.
R.G – Como nasce a violência política?G.S. – Quem não tem o poder político quer tirá-lo de quem o tem. E quem o tem, para protegê-lo, usa agentes provocadores.
R.G – Como se extirpa?G.S. – Sobretudo extirpando-se os nacionalismos, fomentadores de violência.
R.G – O que é, para você, o amor?G.S. – A mais bela invenção do mundo: entender-se sem necessi­dade de palavras.
R.G – Quantas mulheres você conheceu biblicamente?G.S. – Falaram em dez mil.
R.G – E você o que diz?G.S. – Talvez uma a mais, ou uma a menos.
R.G – Profissionais ou amadoras?G.S. – Muitas jovens atrizes e bailarinas.
R.G – É ciumento?G.S. – Gostaria de não sê-lo. Mas sempre fui, e o sou. Terri­velmente.
R.G – Quando o ciúme impede o adultério?G.S. – Casei em primeiras núpcias com uma mulher ciumentíssima, que, depois do primeiro dia de casados, ou da primeira noite, não recordo, ameaçou de se suicidar se algum dia eu a traísse.
R.G – E você?G.S. – Eu a traí escondido durante vinte anos, odiando-a.
R.G – Odiando-a?G.S. – Sim, porque não há nada mais humilhante, mais ofensivo à nossa dignidade do que a coerção à mentira.
R.G – E vocês se separaram.G.S. – Sim, e uma semana depois, ela, que tinha quarenta anos, passou a andar com um garoto de dezesseis.
R.G – Você esteve verdadeiramente apaixonado por Josephine Baker?G.S. – Eu tinha vinte e dois anos, inexperiente, desconhecido, e ela era ultra-célebre. Mas foi uma relação brevíssima.
R.G – Como acabou?G.S. – Num certo momento, fugi para uma ilha.
R.G – Por quê?G.S. – Não queria me tornar o Sr. Baker.
R.G – É mais difícil viver ou conviver?G.S. – É melhor conviver. A solidão é atroz. Sobretudo para o homem a quem falta a força de caráter e o espírito de iniciativa femininos.
R.G – Chega-se mais bem preparado ao casamento ou à morte?G.S. – A morte é previsível. O casamento, sempre uma incóg­nita.
R.G – As mulheres devem ser tratadas com cavalheirismo?G.S. – Sim.
R.G – E os homens com amabilidade?G.S. – Sim.
R.G – É mais fácil entender os outros ou a si mesmo?G.S. – A si mesmo.
R.G – Você sempre foi ao fundo de si mesmo?G.S. – Sou o meu melhor psicanalista.
R.G – Nunca deixou alguma coisa pela metade?G.S. – Jamais.
R.G – Qual é o conselho que lhe foi mais útil durante a vida?G.S. – Não julgar nunca. Foi um conselho do meu pai.
R.G – Já esteve ameaçado de falir?G.S. – Não. Mas tive meus altos e baixos.
R.G – O sucesso modificou-o?G.S. – Em nada.
R.G – Dizem que é um misantropo.G.S. – Ao contrário: adoro as pessoas, a vida.
R.G – E que é cínico.G.S. – Se cínico é quem diz o que pensa, sim.
R.G – Quem são seus amigos?G.S. – Pouquíssimos.
R.G – Diga um.G.S. – Fellini. Embora fiquemos meses sem nos vermos, nem nos telefonarmos.
R.G – E os seus inimigos?G.S. – A minha última mulher. Eu, porém, não a considero assim.
R.G – Também para você, como para Voltaire, o trabalho é alegria?G.S. – Sim, mas a que preço!
R.G – No seu passaporte está escrito “aposentado”?G.S. – Não: sem profissão.

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