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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Jeremy Mercer - Um Livro Por Dia


A Editora Casa da Palavra publicou Um Livro Por Dia de Jeremy Mercer que tem a seguinte sinopse, extraido de (http://doraexlibris.wordpress.com/2008/04/16/um-livro-por-dia-de-jeremy-mercer/):


É difícil acreditar que uma história como a que foi contada por Jeremy Mercer realmente tenha acontecido. Seria muito mais fácil pra nós leitores acreditarmos que é uma obra de “ficção”, mas é incrívelmente mais fascinante acreditar que é uma obra “baseada em fatos reais”. Clichê, porém verdade. É um tanto quanto surreal acreditar que uma loja como a Shakespeare & Company realmente exista e tenha se mantido na ativa por tanto tempo num ambiente capitalista. Mas se levarmos em conta que o “ambiente capitalista” é a capital mundial intelectual que é Paris, na França, tudo começa a ser um pouco mais compreensível.

Pessoalmente acredito que Mercer não precisaria ter ido tão longe pra se desvencilhar dos apuros em que se meteu. Poderia ir pro interior dos Estados Unidos, ou pros recônditos mais gélidos do Canadá mesmo. Até agora me pergunto “Por que tão longe? Por que Paris?”. No livro não existe essa resposta e talvez ela não exista nem mesmo na cabeça do autor. Fato é que o jornalista resolveu refugiar-se no velho mundo, com pouco dinheiro, sem muitos recursos e sem conhecidos. Uma aventura e tanto pra um branco, de classe média, de país desenvolvido. Em seu livro, Mercer não só descreve a história da loja, como também de seu proprietário, George Whitman, um homem com uma história de vida extraordinária.

Falar dele sem falar da Shakespeare & Company (e vice versa) não faria sentido algum. Whitman pode com toda a certeza ser considerado um bibliófilo, no melhor estilo marxista-comunista. As frases que George mais costumava dizer (pois parecem ser as mais repetidas ao longo do livro) são “Não seja um mau anfitrião para os estranhos, pois eles podem ser anjos disfarçados” e “Dê o que puder, pegue o que precisar”. Para Mercer parecia loucura a forma com que George acreditava não só em sua ideologia, mas também na bondade inerente das pessoas. Sua livraria oferecia não apenas chás, sopa e pão, como também era um teto para escritores em hiatos criativos ou sem lugar pra ficar em Paris e turistas curiosos e afeitos ao glamour e às lendas e mitos que corriam sobre a loja, como a de George ser filho do Walt Whitman e sobre Shakespeare já ter morado lá. E George geralmente dizia às pessoas que essas coisas eram verdade por que “as pessoas ficam felizes com isso”, segundo ele.

Ao contar a história da loja, que foi aberta em 1951, o autor lembrou de frequentadores bastante famosos tais como Henry Miller, Anaïs Nin e mais tarde a turma dos beatnicks ou beats, contando com Jack Kerouack e Allen Ginsberg. Ele também citou que a Shakespeare & Company acobertou estudantes das manifestações de maio de 68, tais como foram retratados em filmes como “Os Sonhadores” de Bertolucci. Mesmo em se tratando de uma utopia socialista, a livraria não fugia às pressões de um mundo capitalista e ainda assim existia uma pequena hierarquia social lá dentro, um tipo de “política social” bastante restrita aos residentes apenas. Whitman tinha o dom anarquista de colocar as pessoas em situações desconfortáveis apenas para ver o que poderia acontecer, bem como quando pediu a Jeremy para mandar Simon embora do antiquário. Simon era um poeta com uma idade avançada, ex-alcoólatra, mas ainda assim usuário de codeína e haxixe. Além de Simon, Mercer conviveu e relatou os perfis de cada um dos vários residentes tais como Kurt, Ablimit, Eva e Elina, moça por quem acabou se apaixonando.

De qualquer forma, é possível afirmar que o autor demorou bastante a entender o “espírito” da loja, seu funcionamento e de como funcionava também a mente de Whitman. Quando foi pedir lugar pra ficar por lá, a primeira coisa que George o dissera foi “Se você realmente fosse um escritor, nem teria pedido pra ficar, simplesmente ficaria”. Querendo ou não, o autor ainda tinha concepções muito enraizadas de sua criação num país capitalista e desenvolvido. Às vezes ele reclamava dizendo “senti-me um membro que contribuía para a equipe e só lamentava que George não tivesse me visto dando duro”, sendo que, mesmo que o visse, ele não se importaria de qualquer forma. O senhor Whitman não era um homem de “trocas”, nem de “favores”. Esse não é, nunca foi, seu foco. Ele é um homem livre e acredita que as pessoas que o cercam também são livres. Whitman era um libertário no sentido mais amplo e extremo imaginável, o que sempre foi um tanto quanto inconcebível pra Mercer.

“George tinha descoberto que o dinheiro era o maior senhor de escravos, e ao reduzir sua dependência dele as pessoas eram capazes de afrouxar a pressão de um mundo sufocante” aprendeu o autor ao final do livro. Na verdade aprendeu muito mais que isso quando entendeu para si mesmo que “Eu acordava vendo um estranho se vestindo na minha frente e aprendera a não pensar nada sobre isso. Voltava para a livraria depois de um café no Panis e descobria um novo corpo babando no meu travesseiro, e limitava-me a oferecer a ele outro cobertor”. Mercer tornou-se alguém menos preocupado com os alardes da vida moderna e tornou-se uma pessoa espiritualmente mais generosa, independente da concepção política que a loja e seu dono carregavam. Em dias de “Aldeia global”, onde um individualismo exacerbado e padronizado é a base de todas as coisas, perceber que “quanto mais forte a comunidade, mais forte o indivíduo” é pra poucas pessoas tem a coragem e esperança de acreditar num futuro melhor.

Finalizando, uma das partes mais emocionantes do livro foi o reencontro de George com sua filha, Sylvia. Só a partir do momento em que Mercer se prontifica a procurar pela filha de George é que é possível entender a importância do autor na vida da Shakespeare & Company. É impressionante perceber que o nome do livro em português “Um livro por dia” faz todo o sentido por que, mesmo que o autor não tenha de fato lido um livro por dia na Shakespeare & Company, cada dia em que ele viveu por lá ele tinha uma história diferente pra contar. E essas histórias eram mundos de pessoas diferentes e dentro de cada mundo desses era perfeitamente possível conceber um livro, caso fosse humanamente possível. E isso faz mais sentido ainda ao notarmos que ao final do livro o autor refere-se ainda, talvez sem saber, a Umberto Eco, ao dizer que “a vida é uma obra aberta”. A vida é de fato uma obra aberta, pois até a morte ela é contínua: os personagens mudam interna e externamente, os cenários e as concepções de vida se modificam como dunas. Mas a história é marcada, etérea e eterna.

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